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Antes de partir
29 de julho de 2014
O filme “Antes de partir” nos remete a uma infinidade de reflexões, considerando os diversos pontos-de-vista dentro da história e os variados aspectos de quem a vê, levando em conta a posição e experiência de vida de cada um.
A história começa apresentando dois personagens principais, Edward e Carter. Ambos são velhos, com câncer terminal e se conhecem dividindo um leito de hospital. Um deles é bilionário, dono do hospital em que se encontram, é casado e divorciado quatro vezes, mostrando que não teve sucesso em sua vida emocional, além da relação interrompida com sua única filha. Edward é arrogante, pretensioso, autoritário e trata a maioria das pessoas com descaso. O outro homem é negro, bem sucedido no casamento, pai de três filhos, porém um mecânico de classe média, que sonhava ser professor de história. Carter é gentil, intelectual, dono de conhecimentos gerais acima da média e muito acima de Edward, que mostra pouco se importar com isso.
O enredo de certa forma já insinua a diferença como uma indução à primeira reflexão: de um lado o homem rico, bem sucedido nos negócios e falido na vida emocional e vice-versa. Este aspecto não é regra geral na vida, apenas um ponto destacado no filme desde o princípio, como pano de fundo.
A mensagem principal do longa é a necessidade de “se viver” e “se encontrar” em algum momento da vida, ainda que este momento seja no fim. No caso dos protagonistas, ambos precisaram da certeza da morte, para se darem a chance de viver momentos de alegria e de realizações, dando então sentido à vida e à morte.
Eles criam despretensiosamente uma lista de coisas a serem feitas antes de morrer. Nela estão atos como: pular de paraquedas, apostar corrida num autódromo, beijar a garota mais bonita do mundo, visitar países como a África, China, Egito e Nepal. Fazer um ato de bondade a um completo estranho, entre outros.
O filme toca nossos corações de uma forma profunda, pois fala de vida e morte, e de uma amizade verdadeira que começa entre dois estranhos no fim de suas vidas.
Edward e Carter com “certa” ajuda no final, conseguem realizar todos os itens de sua lista. Mas não é a lista em si que torna a história importante, nem mesmo o realizar coisas supostamente grandiosas antes de morrer. O que acontece durante a realização dos itens da lista é a mensagem principal do filme: se descobrir, ou simplesmente se redescobrir como ser humano: como pai, marido, avô, amigo ou como for.
Jack Nicholson em aula real de Paraquedismo.
A melhor cena em minha opinião, apesar de bastante simples, é quando Edward vê sua neta pela primeira vez e dá um beijo em seu rosto. Em seguida ele risca da lista o item: “beijar a garota mais linda do mundo”. A chegada de uma criança na vida de um adulto é como um novo despertar, uma chance para o velho a partir daquele que é novo. Embora Edward estivesse fadado já à sua sentença de morte, uma neta em sua vida era como uma redenção, uma chance de ser como avô, o pai que não havia sido.
Apesar de achar o filme lindo e gostar de sua mensagem, também aponto uma crítica ao mesmo, uma vez que hoje em dia muito se fala sobre o que fazer antes de morrer. É imperdoável, do meu ponto de vista, a infinidade de títulos de livros à venda na internet e em livrarias com títulos como: “As 10 coisas para se fazer antes de morrer”, “Os 10 lugares para ir antes de morrer”, ”As 10 ilhas para se visitar antes de morrer” e por aí vai.
A morte não deveria ser a razão para nada. Morte é algo inevitável e natural. Um dia ela vem e ponto. Sou contra a ideia de se viver pensando na morte. Pois muitos deixam de viver com medo de morrer. E outros têm que encontrar na morte razões para viver.
Vida e amor são coisas que existem dentro de nós e que são buscadas durante toda uma vida. Muito se caminha para entender os valores e a localização de ambos. Mais uma vez: dentro de cada um de nós.
Vida é curta, tempo não volta. Há de se viver o cada dia. E para uma vida feliz não é necessária uma lista cheia de loucuras e viagens caras mundo afora. Muito mais do que doideiras, coisas materiais e requinte, o prazer da vida está nas pequenas coisas. E por mais que isso soe como clichê, o próprio filme demonstra isso. Pois não é a lista cumprida de Edward e Carter que trás felicidade aos dois senhores, mas a amizade que nasce entre os dois, a cumplicidade e afinidade num momento de tão intensa dor. O redescobrimento deles mesmos como seres humanos.
Que a nós, jovens, adultos e velhos, não seja necessário uma sentença de morte para se começar a viver. Porque a vida é um recomeço por si só todos os dias.
Cabe a cada um de nós, viver ou não.
Trailer oficial do filme:
CAROLINA VILA NOVA
ESCRITORA E ROTEIRISTA, de Curitiba.
Contato: focuslife@playtac.com
Coluna sobre Arte do CINEMA