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CHÁ Inglês
04 de maio de 2013

By Taís Martins

 

O meu coração ainda está cheio das sementes de sensibilidade. Quantas e tantas plantadas nos finais de tarde e em especial nas férias da faculdade. Sorver a vida através de uma conversa sempre iluminada e com uma mesa digna da Rainha da Inglaterra.

Razão e sensibilidade transitavam entre as xícaras e as risadas no apartamento da Rua José Loureiro com número voltado ao horizonte. Aquela senhora de finos modos e cabelos brancos. Com sua charmosa bengala e sentada em sua poltrona favorita. Falava da vida através de suas singelas e magníficas histórias.

At Grandmother´s - Artz oin on canvas

Tantos amores cabiam naquele coração e a diferença de idade de mais de 60 anos desaparecia com facilidade, pois nossos corações falavam um idioma muito particular entre os autores que ela conhecia tão bem e que eu almejava ter discernimento para compreender.

A gentileza era o prato do dia no seu lar sempre organizado. Sua mesura em colocar a mesa e dar as ordens na casa era uma cena particular. Muito aprendi com sua forma doce e enérgica de conduzir a vida. Afinal, escondida na sua fragilidade havia uma mulher digna do Olimpo.

Quantos amores começaram e terminaram naquela sala. Sem esquecer as inúmeras vezes que lá cheguei aos prantos e fui contaminada pelo seu carinho e pelo seu sorriso. E noutros momentos apesar das gargalhadas terminamos nos solidarizando através das lágrimas.

Hão de chorar, aqueles que não têm avós. Meu grande tesouro na vida foi conhecer os meus e conviver com eles. Ouvir suas histórias e suas broncas e algumas vezes dormir no chão enrolada aos seus pés. E a vida graciosa permitiu que eu fosse adotada como neta da Dona Vera. Uma honraria impossível de ser descrita.

A beleza das diferenças. Pois com a minha avó Vera eu aprendi de modo efêmero – que devia ter coragem de mostrar minhas páginas poéticas. Por quantos dias e horas nos refugiamos na literatura. De um lado as suas dores da idade senil e de outro o meu jovem coração cheio de dores com as quais ela lidava tão bem.

Fiz muitas promessas nos entardeceres cheios de luz e me lembro de que a mudança para a Dr. Faivre a deixou deveras chateada. Mas, assim éramos nós conjugando verbos certos em tempos incertos. Compartilhávamos o melhor de nós e aprendíamos sempre, pois as suas lições me ensinavam a viver mais feliz. E eu a fazia rir. Sempre.

E quando dos seus humores mais arredios – por motivos indiscutíveis - escondia-se no quarto, mas logo retornava - envolta numa névoa sublime de perfume e pó de arroz. Como toda a avó tem aquele cheiro de nuvem. Que a gente toca sem entender a intensidade. Essa doçura não se divorcia da alma de quem a amou e foi amado um dia.

Sou uma pessoa que nunca apreciou as visitas em casa. Pois, imaginava torar a privacidade da pessoa que se obriga a nos receber. Um porém, naquela casa estive muitas vezes por mais que mudassem os endereços. Longe ou perto. Sempre havia um telefone que nos aproximava e gerava um novo convite.

Por vezes, reunimos toda a patota. Pois, como uma avó amada não teria uma neta fabulosa. Nina era e sempre será a mais doce das amigas. Tom de voz calmo e uma paciência nipônica. Recebia a “horda” na casa da Dona Vera e ríamos como se fosse a última vez. Com a Desirê, a Madeleine e com Carla.

Muitas mudanças e no seu último endereço na Chile a última visita. Soube de sua morte dias depois e não pude chorar. Precisei rever cada memória. Cada angústia compartilhada. Cada conselho que me ajuda ainda hoje. Necessitei encontrar aqueles cabelos brancos e seu hobby salmão que combinava com as pantufas.

Recordei que ela não gostava do cachorro e que não estava acostumada com a nova casa. Mas, qual nada para ela a família sempre foi a coisa mais importante do mundo. Deixara de ensinar como normalista, pois o marido queria uma senhora do lar e zelosa dos filhos.

Tudo se cumpriu naquela senhora de olhar lânguido e comovente. Recordo-me muito mais da primeira vez que a vi. Pois no fundo meu coração rejeitou sua partida. Ela habita os meus melhores sonhos. Quanto tomo chá ainda posso ver suas mãos cuidadosas com os pratinhos e xícaras. Servindo o bolo ainda fresco. E sorvendo a vida!

Taís Martins

Escritora, MsC, e professora.

Contato:  taisprof@hotmail.com

Contato: focuslife@playtac.com

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Os caminhos da imaginação pela Escrita

Deixe seu comentrio:

  • Nina Franco Brunatto

    Quanta emoção, quanta sensibilidade, quanto amor !!! Que saudades desses dias únicos, maravilhosos ao lado das pessoas que eu tanto amo...minha eterna e grande amiga, não me canso de dizer a todos que o seu dom para escrever e nos sensibilizar é imenso, lindo. Através da sua arte conseguimos vislumbrar a beleza da sua alma e dos seus sentimentos mais íntimos. Obrigada pela sua amizade e pela belíssima homenagem à minha tão querida e saudosa avó . Te amo.

  • juliene soares

    trabalho maravilhoso, agora estou retomando meu hábito de ler ,amo poesias..estou amando tudo isso.Parabéns ..

  • Joice Becker

    Reflexão sincera, com a intensidade de sempre. Dá para entender porque o normal, cotidiano n?o lhe basta. Sua vida é um livro e em cada página que viramos, descobrimos algo extraordinário. Com admiraç?o.