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Fotografias
29 de julho de 2013

"Tem razão o poeta: “O amor é a coisa mais triste quando se desfaz.” É triste por causa do retrato: porque ele faz lembrar uma felicidade que se teve e que não se tem mais. O retrato é uma sepultura."

Rubem Alves

 

O prazer e a dor de recordar. Misturados em películas que amealhamos nas caixas enfeitadas. Nos álbuns antigos e no computador. O tempo impresso em forma e cores. Capazes de nos provocar sorrisos e lágrimas de modo incontido. Uma imagem que nos revela acertos e por vezes enganos - dos quais não podemos mais nos redimir...

Há algo de meticuloso naquilo que guardamos. Porque guardamos?. O que nos leva a preencher os cantos dos armários e a estante da sala com as pessoas que nem sempre participam efetivamente da nossa vida. O que há de inquebrantável naquela lembrança que não conseguimos “deletar” do arquivo e muitas vezes nem do coração.

Eu particularmente amo fotografar momentos. É como guardá-los e revivê-los quando as nossas energias estão esmaecidas. Gosto de rir daquelas roupas antigas que juramos nunca mais usar e que quando reeditadas de décadas em décadas - o que era ridículo se transformou na última moda...

Ver a imagem dos pequeninos que um dia choravam por uma boneca ou um carrinho e que hoje se preparam para a universidade. Rever com emoção as fotos do primeiro aniversário e de todos os outros. Ver que a altura mudou, mas que o sorriso é sempre familiar, pois ainda esperamos que eles pulem em nosso colo e festejem a nossa volta do trabalho.

O assombramento daqueles cabelos pintados, cortados ou elaborados na forma de penteado naquilo que chamamos de vergonha alheia. Há charme também nos fios brancos que insistem em contar que já não temos mais quinze anos apesar de sonhar com castelos e fadas. Qual seria a graça da vida sem um pouco de romance...

Nos romances residem tantos panoramas. Há o primeiro amor. Há os começos, meios e finais nem sempre felizes que trazemos conosco. Sem nenhuma metodologia nos acostumamos a encarar a s tristezas como desafios. As amarguras como aprendizados. Jogando o jogo do contente como a Pollyana de Eleanor H. Porter.

 

Muitas vezes quando converso com os meus alunos vejo que eles creem muito na minha personagem. Imaginam que o fato de sorrir sempre. Indica que eu não encare problemas. Que eu não tenha medos comuns. O facebook sempre povoado de fotografias exibindo a professora, a mãe, a escritora, a advogada em belos vestidos e sempre em boa companhia.

 

Um poeta é um sonhador...Finge que é dor a dor que deveras sente como dizia Fernando Pessoa. Creio que nossas amarguras fazem parte dos nossos mistérios irreveláveis. O que escrevo pode ser verdade ou mentira. Dependo do prazer que sinto em escrever. Existem abismos muito mais convidativos do que o conforto de um sofá solitário.

 

Mergulho em mim. Nas páginas que leio e que ouso escrever. E quando não reconheço meu semblante ou minha caligrafia poética retomo as minhas caixas coloridas. Plenas de imagens de quem eu fui. De quem eu sou. E através delas vou remontando a pessoa na qual pretendo me transformar. Há tantos sonhos antigos que conflem e por vezes se distanciam dos novos...

 

Penso nos eventos novos. Afinal em breve outro livro será publicado. Imagino qual será a melhor pose para apresentar as minhas páginas cheias de emoções. Da última vez para a capa foram mais de 350 fotos para escolher uma única imagem. Aquela que tudo dizia sem legenda. Talvez seja essa uma das maiores graças da foto – dizer em silencio e abrir probabilidades...

 

O poder revelador ou traidor de uma foto. Um sorriso. Uma lágrima. Um lugar secreto. Um beijo maravilhoso e sem nenhum afeto. Abraços de despedida. Bailes de formatura. Ou dois casamentos fracassados com uma noiva vestida para a felicidade, mas que entre os lábios balbuciava suas incertezas que foram proteladas no tempo e em promessas inúteis.

 

Mas tudo está guardado. As fotos do passado. Fotos de família. Enlaces de uma vida intensa e ao mesmo tempo repleta de enganos. Apesar dos beijos e abraços. Dos convites de baile e festas de aniversário. Percebo que há uma solidão nas laterais dos meus ombros. O que não me desestimula. Continuarei tentando prender o tempo e congelar os momentos da vida...

A escrita e as fotos marcam a minha vida. Porém quando escrevo não posso pedir exatidão das imagens que proponho nos meus poemas e tampouco nos contos. O que acontece com as fotografias é mais simples. Posso ler os sentimentos sem revelar impressões. As roupas e os cabelos são o disfarce perfeito para o que sinto e para o que finjo sentir...

Como disse Cecília Meireles no poema feito para sua avó Jacinta Garcia Benevides: “não tens fala, nem movimento nem corpo. E eu te reconheço. Ah, mas a mim, a mim. Quem sabe se me poderás reconhecer!” Eu sempre serei capaz de me reconhecer antes de definhar a memória, mas quando o corpo definhar eu ainda serei capaz de ver a bailarina que nunca fui, mas tentei.

Taís Martins

Escritora, MsC, e professora.

Contato:  taisprof@hotmail.com

              focuslife@playtac.com

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