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o vendedor de panos de prato
14 de fevereiro de 2014
Era mais um dia comum, domingo, calor infernal em Curitiba. Abri a janela do meu quarto e vi uma espécie de banquinha sobre a calçada. Parecia de um vendedor ambulante. Mais tarde ao sair de casa, me sentei em frente ao prédio para esperar por amigos. Tudo passava pela minha cabeça naquele momento: as contas pra pagar, o fim de semana acabando, o clima que estava judiando há semanas, os problemas que não se resolviam. Enquanto pensava, olhava o trânsito intenso de carros e de pessoas que passam ali em frente todos os dias.
O desânimo de uma fase difícil que estava demorando pra passar já tinha tomado conta. Meu olhar sobre aquela paisagem era indiferente. Foi então que ouvi bem ao fundo um assovio. Alguém parecia assoviar uma música em meio àquele barulho todo. Parecia que a música ia e voltava, e eu não conseguia entender como era capaz de ouvir aquilo com tantos carros passando. Olhei por tudo ao meu redor e foi então que eu vi: o vendedor de panos de pratos.
Ele subia e descia uns 10 metros da Avenida João Gbur com um cartaz pendurado em seu pescoço: 6 panos por 10 reais! Andava lentamente, na velocidade que uma pessoa já de idade exige. À sombra da grande árvore, a mesma que favorecia a mim, o homem velho tentava vender seus panos. Parecia ter dificuldade para andar, mas nenhuma para viver em seu próprio mundo, bem diferente do cenário que o representava.
Até agora não sei dizer se aquele assovio me tirou da realidade ou me trouxe de volta à ela. Pelo menos, me fez refletir sobre o que deveria ser aquele momento: o cheio de problemas atormentando minha mente, ou aquele mais simples que eu enxergava perfeitamente no caminhar do senhor simples e seu assovio.
Meus pensamentos desapareceram e trocaram de posição com a música que ele entoava. Conhecia ela de algum lugar, tanto que sabia o que viria depois, mas mesmo assim não conseguia me lembrar. Se antes o assovio estava ao fundo, em seguida se tornou como aqueles efeitos de filme cinematográfico. O assovio subiu de tom e todo o resto virou “pano de fundo”.
O homem continuava subindo e descendo a avenida em seu ritmo lento. E eu seguia o ritmo de sua música me esforçando para recordar. “Afinal, o que ele está assoviando? Eu conheço essa música.” Como poderia saber o assovio seguinte se não conseguia me lembrar da música?
Mas ela estava lá, tão forte em minha memória como os problemas que atormentavam o meu presente. Foi então que eu lembrei: o senhor assoviava um hino de igreja. Há tantos anos não ouvia, mas pude então seguir seu assovio com a letra que deveria ser cantada com ele. Não cantei em voz alta, nem era preciso. Todo meu ser acompanhava a sua música a ponto de não ouvir as dezenas de carros que passavam no cruzamento incessantemente.
Meus amigos chegaram e eu fui embora. O vendedor de panos de pratos continuou lá. E apesar de não tê-lo visto vender um pano sequer, vi seu sucesso em seu assoviar. Na sua vida simples, que apesar de aparentemente pequena, naquele momento deu sentido à minha.
Seu assovio ecoou por toda a tarde em minha mente, meus pensamentos se aquietaram e eu senti a paz de seu ser dentro de mim.
Eu deveria ter comprado ao menos seis panos...
CAROLINA VILA NOVA ESCRITORA E ROTEIRISTA, de Curitiba. Contato: focuslife@playtac.com |
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joce
E vc lembra como era essa música?