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"Os covardes morrem várias vezes antes da sua morte, mas o homem corajoso experimenta a morte apenas uma vez. "

William Shakespeare

A tristeza e a felicidade não apresentam o hábito consultar as nossas angústias e anseios antes de promoverem as suas instalações na sala dos sentimentos particulares. Há mudanças que podem servir como referenciais na vida. Nem todas, porém são dignas de nota. Entre elas - reconhecer que existe um traço de infelicidade naquilo que vivemos ou fazemos num dado momento da vida requer coragem em dois vértices.

Proceder à assunção das nossas escolhas. Verificá-las amiúde entre sucessos e fracassos requer um esforço abissal. Eis que é deveras fácil permear fotos de facebook, instagram e incontáveis fontes visuais que indicam que somos irremediavelmente felizes, perfeitos e praticamos atitudes irrepreensíveis. Outrossim o mascaramento do que sentimos e das coisas que deixamos de sentir faz de cada alma uma prisioneira de sua estúpida argúcia.

No balaço das intempéries emocionais. Revirei as oportunidades de trabalho. As ofertas de parceria. Analisei cada situação tensa ou divertida que aconteceu nos últimos dois anos. Um tempo curto. Afinal revisar raízes muito profundas pode arrebatar o futuro contaminado com dores do passado. Nem sempre há cautela em nossos labirintos...A inteligência não é capaz de evitar todas as armadilhas do destino.

Passei os olhos de modo leve e nada leviano naqueles que amei e partiram de mim ou em mim. Vislumbro os encantos e desencantos amealhados. Percebo que os contos de fadas turvaram a lucidez das escolhas e procurando a felicidade angariei poucas pétalas e incontáveis espinhos. Com a dor veio a cautela, mas ainda não surgiu a desistência...Quiçá de maneira desavisada eu possa encontrar o meu conto de fadas.

A morte e a vida equilibram seu laço indelével e nem sempre compreensível. Buscando as assertivas acabamos pleiteando a revisão do nosso tempo e das prioridades que nele imprimimos através das nossas ambições. Inúmeras vezes ao perseguir a felicidade nos distanciamos dela ainda mais. Nem tudo o que escolhemos pode nos pertencer e por vezes as coisas que descartamos podem trazem uma satisfação quase indescritível...

Amava e ainda amo as estrelas que vislumbrei pela minha janela. O desprendimento trouxe a sua lição pontual mostrando que posso ainda ver as estrelas, mas encará-las por outras janelas. Fui à princesa da casa de vidro e nela os reflexos dos príncipes do passado foram trancafiados. Agora plebéia - caminho pela praia encontrando a mulher que sou e a princesa que nunca desejei ser. Afinal nasci rainha dos meus sentimentos.

Minha voz não encanta como as sereias. Isso não me incomoda. Minhas histórias são devidamente escritas e silenciosas. Cada leitor dará a ela a sua significância através do meu significado. Por vezes o silêncio é o maior barulho que se pode produzir no âmago de quem busca nos seus olhos respostas, mas termina por encontrar as suas próprias indagações. Dúvidas sempre assediam os anseios - é o caminhar coerente da vida.

Minha alma não aceita superficialidades. Gosto dos abismos, das insanidades e das incongruências. Coisas básicas só me atraem na gastronomia. Sabores singelos que trazem consigo grandes combinações. A personalidade de cada um funciona segundo o fervilhar do sangue. E o meu nunca cessa. Não aceito as condenações alheias por desconfiar dos julgadores e de seus julgamentos absolutistas.

A força motriz do sucesso é a constância de sua busca. A plenitude é utópica. Nem a beleza é a mesma em todos os espelhos e para todos os olhos. Perseguir sonhos é a maneira mais conhecida de abastecer a alma. Observei muitos castelos construídos em mármores, marfins e povoados de obras do mais significativo quilate. No entanto, havia entre as paredes e as muitas salas um vazio assolador comum aos grandes presídios.

Tenho o prazer incansável das mudanças e uma conduta de alma cigana. As inúmeras paragens encantam, desafiam e trazem um alento particular que só o viajante conhece. A insalubridade da água não se descobre unicamente por seu aspecto. É preciso provar de seus sabores, observar suas nuances para forjar as próprias convicções. A confiança é um fino cristal que deve ocupar a mesa somente nas ocasiões mais especiais. Sob pena das perdas irreparáveis.

Minha janela encontra o mar e meu tapete da entrada está rebordado de areia. Reconheço meus sonhos antigos e contenho os sorrisos ao pensar no tempo com prazer. A paz é uma visita recente no meu lar. Abandonei as obras de arte que impediam que eu pudesse abrir a alma para ver o céu povoado de estrelas. Descartei a beleza fugidia da exposição do sucesso. Minhas condolências sinceras para as histórias passadas. Escreverei outras.

O amargor delas será em breve esquecido e haverá em cada capítulo novos personagens e uma leveza que a caneta e o coração não mais percebiam diante das tempestades recentes. Caminhei por terras distantes e transitava nos caminhos da rotina com olhos opacos e sem o mesmo viço. Sentia que o divórcio das pequenas alegrias fazia uma falta imensa. Decidida a reencontrar meus íntimos e irretocáveis sonhos preparei minha silenciosa partida...

Navegar é magnífico. Viajar amplia o gozo da vida. Destarte uma alma ansiosa precisa de um porto seguro para descansar. As emoções necessitam de refúgio e de santos espíritos que entre números cabalísticos avistam o encanto das coisas singulares que se prestam a magia dos intermináveis escritos. Na efêmera paz a segurança é sempre um convite para as permanências. O amanhã está desprendido do ontem, pois hoje no céu só há estrelas futuras.

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